"Todas as cartas de amor são ridículas."





Olá, S.


Esta carta, que nunca te há-de chegar às mãos, é a minha despedida.


Sei que tu e o teu irmão vão-se embora daqui a uma semana. Finalmente chegou, o dia do adeus. Consigo imaginar o quão feliz e aliviado te deves sentir - sei como te sentes frustrado com a vida que tens trazido. De facto, desde que a J. te deixou, entraste numa espiral de extremismo; foste (como eu já fui um dia) barco perdido no mar, à deriva. Ias-te guiando pelos teus caprichos - o que explica o porquê de me teres mantido por perto por quase seis meses. Quem diria. Bem, não foram. Teriam sido, mas decidiste terminar a nossa amizade um dia antes. Teríamos feito seis meses. Teríamos feito muitos mais, se tu tivesses tentado. Mas isso é algo que já não vale a pena opinar sobre; should have, could have, would have, right? As pessoas revelam-se, o tempo passa, as situações mudam. Foi ingénuo pensar que as coisas ficariam na mesma, e que conseguia colocar a minha vida em pausa - e a tua, também - enquanto tentava arranjar uma solução para as tuas frustações. A Primavera chegou, e trouxe a mudança consigo. Como sempre, lutei contra ela. Com todas as forças que tinha. Tanto, que adoeci. Provavelmente não sabes, mas quando estive doente, pensei que ia morrer. Sou uma choninhas, como diz a Mónica. Mas acreditei que ia morrer, deitada na cama, constantemente a perder a consciência. E lembrei-me de ti. Mas neste dia foi diferente. Lembrei-me do sinal de nascença que tens, e como eu ainda consigo visualizar tão bem a palma da tua mão. Visualizei os canudos que o teu cabelo faz - fazia, já não, que cortaste o cabelo. Mas faltava o teu cheiro, e as tuas feições. Começas a ficar enevoado na minha mente. Não tenho as fotografias que te tirei, apaguei-as num momento de raiva magoada. Já começo a arrepender-me disso, à medida que o dia da partida se aproxima. Mas é melhor deste modo, trago tantos arrependimentos às costas, o que é mais um? Lembrei-me do teu nome, e a minha garganta fechou-se quando tentei dizê-lo em voz alta. Parece que já não sei pronunciá-lo, a minha voz falha, e fica um sussurro um pouco mais alto a partir da segunda sílaba.


Magoa-me saber que te vais embora, e nós vamos ficar assim. Cortados a meio, quando as coisas estavam a melhorar - ou assim o pensei. Embora todos os outros dissessem o contrário: que eu tinha de me afastar de ti, que tu não prestavas, que eras tão inferior a mim, e que eu merecia alguém melhor. Começo a acreditar que eles tinham razão sobre ti. Mas sabes o que lhes respondia, de todas as vezes? "Tenho pena que ele não te faça sentir o que ele me faz; só eu sei o bem que ele me faz. E por isso, ele vale a pena".
Em minha defesa, eu acreditava mesmo que tu valias a pena, e que apesar da época complicada das nossas vidas, este era o nosso rough patch, o nosso período difícil. Todos os amores têm os seus, e eu, ingenuamente, acreditava que íamos sobreviver a este. Compreendo agora que sempre (me) viste com outros olhos e entendo que eu era a única que amava, entre os dois. Se calhar, ainda era demasiado cedo para tentares a sério, ainda estavas magoado com a J. Mas se este era o caso, a responsabilidade caía nos teus ombros, e tinhas de ser honesto comigo e impor-te. Só tinhas que dizer a verdade, que não te sentias pronto, e afastavas-te de mim. Tão simples quanto isso. Mas não foi isso que fizeste. Mantiveste-me sempre suficientemente perto para que, quando as outras raparigas a quem te atiravas (e que eu sei de todas) te renegassem, eu ainda estaria presente para te aconchegar o ego. Eu fui, simplesmente, alguém com quem te entretiveste, que manteve a cama quente, até chegar quem tu realmente querias. Peço desculpa se não sou quem querias. E peço desculpa, por ter-me esforçado para mudar quem era, para te agradar. Deveria saber que, a partir do momento que alguém me diz que eu não sou boa o suficiente para ele, é a confirmação de que o sou.
 E aqui estamos nós.


Não faço a mínima ideia sobre o que fazer com a minha vida. Dei-te tanta importância, coloquei-te num pedestal tão elevado, que acabei por perder-te de vista. E tu, pássaro selvagem (não fosses tu Gémeos), ficaste farto e foste à procura de novas paisagens. E eu continuei, continuo aqui em baixo, de olhos fixos num céu vazio. Não há mais nada a fazer.


Espero que a tua namorada te faça feliz. Lembra-te que, as únicas partes interessadas nesta equação são tu e ela; ignorem terceiras partes que falem, opinem sobre vós. Não estou a ser hipócrita ao oferecer este conselho; simplesmente, sou madura o suficiente para entender que, enquanto ser humano, mereces ser feliz. Acho que todos os seres humanos o merecem. E é nessa medida que te desejo tudo do bom e do melhor que a vida pode oferecer. E já agora, leva este conselho contigo: Lembra-te que o amor é uma promessa. É encontrares, conheceres alguém muito melhor, mas ficas com a pessoa com quem estás porque lhe prometeste isso, mesmo que no momento seja o mais difícil fazer. E pessoas melhores que tu, que me tratam melhor da maneira que me tratavas, que não me votavam ao desprezo e silêncio durante duas semanas, só para voltar a falar comigo porque a cama parecia-lhes muito vazia, é o que não falta. A qualquer momento destes últimos seis meses eu poderia ter-te deixado, e neste momento, estaria feliz ao lado de alguém que, realmente, gosta de mim. Portanto, nem penses em dizer que eu não te amei. Porque eu fiquei do teu lado, sempre. Escolhi-te em vez dos meus amigos, escolhi-te em vez dos estudos, da minha família, do meu cérebro, que sempre me disse para manter-me longe- tu sempre vieste em primeiro lugar.
Tu prometeste-me, logo no início, de que serias o meu primeiro e o meu último. Pena que te tenhas esquecido disso. E embora não seja a tua última, eu pretendo cumprir a promessa. Foste o meu primeiro e último, e é assim que se ama. Não preciso de tentar mais vezes, com pessoas diferentes. Tu, numa fase má da tua vida, conseguiste-me fazer tão feliz, custa-me imaginar como seríamos se tu realmente gostasses de mim (acho que teria tido um ataque cardíaco de felicidade à algum tempo). Pelo menos eu amei(-te), e foi verdadeiro, for what it's worth.


Boa sorte para o teu futuro. Que tu e o teu irmão se apoiem e tomem conta um do outro. Juízo, muito, do outro lado do mundo. Felicidades para a tua família.


Perdoa-me por esta ridícula carta de amor, mas o poeta tem razão. Sobre mim, não adiciono mais. Prefiro ficar assim, deixar que vagarosa mas definitivamente, me esqueças. Termino assim, esta minha última carta de amor.


Goodbye.


"When you get older, plainer, saner
Will you remember all the danger we came from?
Burnin' like embers, fallin' tender
Long before the days of no surrender years ago
And will you know?"

Comentários

é não é? ainda bem que concordas cmg.
Rute Luz disse…
infelizmente mesmo...
julliette * disse…
não li tudo o que diz esta carta, mas o que li, gostei muuito *.* escreves muito bem :$
P.S adoro o teu 'about me'
Bicho do Mato disse…
Obrigada pelas palavras, Catarina. =)



E sim, é(-me) uma situação muito infeliz ...
' Vanessa . disse…
Fiquei completamente chocada com o que li.

Cada vez mais acho que as pessoas não valem a pena, ou pelo menos grande parte delas. Lamento, esta triste realidade. A única coisa que tens a fazer neste momento é levantar a cabeça e acredita que ninguém te pode ajudar nessa tarefa dificil. Tu, tens que ser dona de ti própria e conseguir, sozinha, arranjar forças.
«Boa sorte.»
Bicho do Mato disse…
Grata pelas palavras = )*

É verdade. Este mundo tornou-se repleto de pessoas ocas e mesquinhas, cujo único objectivo é o prazer instantâneo, independentemente de quem é que têm de atropelar para o conseguir. Que se danem os outros, é o pensamento dominante. O meu umbigo é o que conta.

E depois esquecem-se que os outros também existem, e também têm sentimentos. E somos empurradas para um canto escuro, coberto de pó, tal bonecas que deixaram de estar na moda, para dar espaço à nova boneca popular.

Custa aceitar que fui um desejo passageiro. Mas foi isso que aconteceu, e não consigo mudar o que já foi. Agora, é mesmo para a frente, porque atrás reside o arrependimento. E não há muito mais a fazer.

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